quarta-feira, 24 de junho de 2015

O que todo "nerd" deveria desenvolver

        Vou partir do pressuposto que todos que leem este post têm filhos muito bem sucedidos academicamente (ou seja, imaginando que tenham ótimos resultados em olimpíadas ou são um dos melhores alunos das melhores escolas deste país). Como regra geral, mesmo que eles sejam "nerds", estejam sempre rodeados de muitos amigos, conseguindo  resultados fantásticos, conciliando diversas atividades extra-curriculares, sabemos que precisam desenvolver diversos talentos para alcançarem sucesso profissional. É claro que existem também jovens tão espetaculares, que mesmo que não tenham nenhuma das características abaixo, podem ter um futuro brilhante.
      Talvez, as melhores universidades do mundo, que selecionam seus alunos pelas histórias de vida, possam nos dar uma idéia de quais características valorizar nos jovens.
      Entre as qualidades mais importantes estão:
      1) liderança
      2) resiliência
      3) proatividade
      4) sociabilidade
      5) determinação

1. Liderança:
      O verdadeiro líder não é o "mandão" do grupo, mas aquele que conduz e inspira seus integrantes a alcançarem suas metas. Alguns já nascem com essa característica, mas todos podem aprimorá-la.
      Projetos extra-curriculares em grupo costumam ser um ótimo exercício. Há alguns anos, ouvi de uma aluna que entrou no MIT que o seu trunfo foi o escotismo (ela era líder e participava de encontros internacionais). Criar projetos sociais (como por exemplo, aqueles que dão aulas para alunos de escola pública), montar uma banda, ser diretor de grêmio ou alguma modalidade esportiva, ou até participar de algumas olimpíadas em que a disputa é por equipe, como a de ciências (IJSO) ou robótica, são atividades que ajudam a desenvolver a liderança.
      Como ajudá-los?
      Dentro de cada contexto, vejo muitos pais que souberam explorar (no bom sentido da palavra) o potencial de seus filhos, Podemos mostrar alguns caminhos, abrir portas e viabilizar projetos para eles conduzirem. É muito ingênuo imaginar que jovens muito novinhos tenham criado sozinhos uma empresa ou uma ONG. Por outro lado, é muito óbvio enxergar quando algo é desenvolvido só por adultos. Todo projeto que eles assumam, vão fazer com que desenvolvam seus talentos e adquiram experiências. Existem muitos pais que se envolvem pessoalmente (e bastante), outros que criticam aqueles que fazem isso. Não cabe a ninguém julgar o que é certo e errado. Acredito que cada família tem uma dinâmica própria e, à sua maneira, busca o melhor para seus filhos. Conheço projetos maravilhosos que seriam impossíveis sem a presença dos pais, mas nem por isso desmerece o empenho do jovem que assume seu comando. Quem lê um essay, está muito mais interessado em saber sobre o aprendizado e experiências do aluno, do que simplesmente sobre o projeto que ele desenvolveu.
   
2) Resiliência
       Resiliência é a capacidade de resistir a determinada adversidade, tem a ver com superação.
      Ser alguém sempre bem sucedido não te prepara para a vida. Com certeza, vai chegar um momento em que algo não dá certo. Então, é mais importante saber como lidar com o tropeço, do que só ter histórias de sucesso para contar.
      Muitas universidades perguntam "qual o maior fracasso da sua vida?" ou "o que você aprendeu com seus erros?"
      Ninguém quer errar, fracassar ou perder, mas nem por isso é preciso sentir vergonha pelo fato que aconteceu.
      O que meu filho contou em seus essays, foi exatamente o fato de não ter ido bem em uma das provas da OBF (Olimpíada Brasileira de Física) e, assim não foi convocado para as seletivas da IPHO (Olimpíada Internacional de Física). Por causa disso, precisou seguir por um caminho muito mais complexo de "repescagem" para fazer parte da seletiva final, só que, infelizmente, ficou em 6º lugar (somente 5 alunos fazem parte da equipe). No entanto, algo inusitado aconteceu naquele ano: houve uma desistência, e graças a isso, ele conseguiu ir para a IPHO. A felicidade pela conquista da vaga foi tanta, que foi para a Dinamarca com tamanha garra e determinação, o que o fez conquistar a melhor medalha brasileira daquele ano. Muitos comentaram com ele: "Puxa, que sorte que no seu ano teve uma desistência!". Ele, muito consciente de todo caminho que trilhou respondeu: "Não, não foi sorte! Eu tive que trabalhar muito para conseguir ser o primeiro a ser chamado, caso alguém desistisse".
   
3) Proatividade
      Aquele que consegue antever um problema, agindo de forma eficiente para evitá-lo ou minimizá-lo. Essa capacidade envolve um conhecimento muito amplo da situação. Tornar-se proativo significa adquirir o controle consciente de sua vida, definindo objetivos e lutando para conquistá-los, ao invés de simplesmente saber reagir aos acontecimentos e esperar por oportunidades.
     Ouvi do professor Edmilson (diretor do Etapa), um dos grandes mentores de uma rede muito grande de jovens talentos, que todos eles, em algum momento, tiveram um "despertar". Decidiram que não seriam mais um adolescente "sabor baunilha". Deixariam de ser simplesmente igual a todo mundo. Ninguém consegue se destacar fazendo exatamente o que todos fazem. Quando eles percebem isso, mudam a forma de enxergarem o futuro, eles começam a direcionar seus caminhos, batalhando ativamente na conquista de seus ideais, e não apenas esperando passivamente pelas oportunidades que possam aparecer.
      Como pais, podemos ajudá-los a enxergar como seus talentos, interesses e aptidões poderão ser bem aproveitados. Assim, eles encontram uma motivação para se desenvolver, analisando suas capacidades e oportunidades. Se eles conseguirem visualizar o amanhã, eles conseguirão entender melhor o que precisam fazer hoje.
   
4) Sociabilidade
      Sabemos que muitas vezes, a timidez parece ser uma característica muito frequente nos "nerds", Parece que eles são mais felizes com os livros do que com uma vida social ativa. Nem sempre o que mais entende de um assunto tem o talento para liderar o trabalho em grupo. Muitos bons alunos que sabem resolver os problemas mais difíceis, nem sempre sabem explicar ao colega como chegou àquela resolução.
      Fiz a faculdade de medicina da USP, formei há 25 anos. Sabe aqueles alunos atletiqueiros, que matavam aula e só pensavam no esporte e nas festas? A maioria está muito bem profissionalmente. Por outro lado, alguns daqueles extremamente certinhos, com as melhores notas, nem sempre conseguiram esse sucesso na carreira.
      Um grande "segredo" que ajuda nossos filhos mais tímidos a se desinibirem, é encontrar um grupo com o qual ele se identifique, em outras palavras: "encontrar sua tribo". Nesses grupos de olimpíadas, vemos que eles se sentem felizes e realizados. Muito mais do que a própria competição em si, reina entre eles um espírito de cooperação. Eles se identificam e se respeitam muito. Vibram com sinceridade nas conquistas dos amigos, mesmo sofrendo quando não alcançam os mesmos resultados. Estando em um grupo, fica mais fácil a socialização dentro de um contexto maior. Em uma escola que valoriza as conquistas desses jovens olímpicos, mais alunos com os mesmos interesses se reúnem, criando um ambiente favorável às amizades e à influência positiva que exercem sobre todos os outros alunos. Quanto mais todos os outros alunos percebem que "é legal ser nerd", menos espaço para isolamento ou bullying existirá.
      Por outro lado, não é preciso mudar a personalidade deste jovem. Cada um tem seu jeito de ser. Nós, os pais, muitas vezes achamos que nossos filhos têm que ser "normais", segundo o nosso olhar. Quem disse que só existe o nosso jeito de encarar a normalidade? Talvez, para um aluno brilhante e, quem sabe com Síndrome de Asperger (classificada como a associação de uma superdotação e um tipo de autismo), o seu jeito normal é diferente. Precisamos aprender a respeitá-los também. Quantos "gênios" não foram meio "diferentes"? Será que eles seriam mais felizes se fossem obrigados a viver da forma como achamos que é o "normal"?
   
5) Determinação
      Quando minha filha era bem pequenina, ela treinava ginástica olímpica e eu adorava ficar assistindo suas aulas sentada na arquibancada. Um dia, o exercício era de salto. Ao final da aula, ela não estava contente com o salto que realizava. Lá foi ela conversar com o professor e implorou para ficar mais um pouco (o que, teoricamente, era meio proibido). Sozinha foi treinar. E treinou, treinou, treinou... estava suada, cansada, obstinada... Eu olhava para ela, e minhas lágrimas começaram a rolar. Senti um misto de admiração por ver sua determinação em acertar o salto como queria, emoção por ver sua evolução a cada salto, angústia quando o salto não dava certo e ela até caía, realização por descobrir quanta fibra ela tinha, e encantamento por descobrir a filha batalhadora que a cada salto brilhava ainda mais (não sei se pela felicidade em conseguir melhorar um pouco ou se era mesmo o suor que pingava!)
      Hoje a história se repete, mas com ela estudando. Ela quer fazer faculdade de medicina. Sua determinação em se preparar para o vestibular é algo que me impressiona. De início, a minha tendência, como médica era pregar o equilíbrio entre o lazer, o descanso e os estudos. Mas estou descobrindo que quando um jovem está determinado, sua capacidade se revigora de uma forma incrível, e é isso que o leva a conquistar o que busca. Estou aprendendo a apenas "acompanhar da arquibancada" tudo que ela vem fazendo. Acompanhando cada movimento de longe, vibrando, torcendo e me emocionando. E, se precisar, estarei por perto para ampará-la.
      O professor Edmilson também falou que temos que deixá-los ser "fora de controle". Só assim eles vão poder deslanchar.
   
      Não existe receita de bolo para que tudo transcorra bem na formação de nossos filhos. O papel da família é fundamental para o desenvolvimento de uma criança, mas nem sempre fica claro para nós qual o momento de incentivar e qual o momento de deixá-los por conta deles mesmos. Vemos muitos jovens talentosos que chegaram onde jamais seus pais imaginariam ser possível. Por outro lado, vemos muitos talentos desperdiçados. Trabalhar as características acima, pode ajudá-los a desenvolver seu potencial.
      Fica aí esse desafio de entender quais serão os melhores caminhos a seguir para alcançar uma Educação que forme pessoas completas, produtivas, transformadoras e felizes.
   



   
 

3 comentários:

  1. Não havia lido ainda este post. Muito interessante. Com meu filho ocorreu na IMO o mesmo que VC contou em relação à IPHO, mas não houve a desistência do 5o componente, ou último, sei lá qtos eram. Mas era a mesma situação. E considero perfeita a colocação ref a desistência... Kkk Muito boa!!!

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  2. Não havia lido ainda este post. Muito interessante. Com meu filho ocorreu na IMO o mesmo que VC contou em relação à IPHO, mas não houve a desistência do 5o componente, ou último, sei lá qtos eram. Mas era a mesma situação. E considero perfeita a colocação ref a desistência... Kkk Muito boa!!!

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  3. Quem não acompanha de perto, talvez não imagine o imenso número de alunos brilhantes que concorrem a essas poucas vagas de olimpíadas internacionais. Talvez seja por causa de um pequeno detalhe que não foram selecionados. Mas, dentro de poucos anos, essa participação acaba se tornando apenas um pequeno item no imenso currículo de vida desses jovens incríveis!

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