terça-feira, 24 de março de 2015

Os universitários de hoje são "geração mimada"?

      Acabo de atender uma paciente de 17 anos. Estudiosa, fez o Ensino Médio em um dos melhores colégios da Zona Leste. Dedicou-se muito e passou direto no curso de Publicidade na USP. Hoje está muito desiludida. Para quem estava acostumada a estudar demais, agora ela vai à faculdade e tem poucas aulas (é só meio período). Na verdade, muitas vezes o professor não dá aula, só manda ler alguns capítulos do livro e fazer um trabalho. Os colegas (em geral, bem mais velhos) curtem mais as festas e a atlética do que se preocupam em estudar. Está com dificuldade em se enturmar, pois não encontra um grupo com que se identifique. Os pais não têm nenhuma forma de interferirem nesse processo.
      Já por outro lado, na mídia, recentemente saiu um artigo sobre a faculdade Belas Artes, onde se realizam reuniões com os pais, adota-se o boletim e se considera que a maioria dos alunos desta geração são "mimados"  http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2015/03/1606430-faculdade-faz-ate-reuniao-de-pais-contra-geracao-mimada.shtml
   
      Imagine-se um jovem de 17 anos. Você vai para uma faculdade onde todos se consideram "adultos". Então, para se enturmar, você vai adotar os mesmos valores. Muitas vezes acaba se empolgando com as festas, as bebidas (ou até drogas) e só se preocupa em "passar de ano". Curte muito essa fase, achando que faculdade é isso.
      Por outro lado, vamos supor que seus pais estão pagando a sua faculdade, por isso até têm um certo "poder" para exigir desempenho. A faculdade, que é uma empresa, precisa "agradar" quem paga. Assim, vai valorizar as exigências dos pais.

      Na prática, todos vão se formar. O mercado de trabalho vai selecionar o jovem mais bem preparado. Qual dessas formações será a melhor?
      Caímos no velho jargão de sempre: tudo depende. Tem aqueles que estudarão muito, mesmo sem a tutoria dos pais, e os filhos que não estudarão nada, mesmo com uma grande "marcação cerrada". Além de tudo, nem sempre se dá melhor o que mais estudou.
   
      Não sei como são as outras faculdades americanas, mas na Caltech, existem várias reuniões de pais. Essas reuniões servem para apresentar a Instituição, discutir os programas dos cursos, tirar dúvidas dos pais, apresentar projetos que os filhos podem desenvolver, etc. Eles também têm um grupo "Caltech parents", que sempre passam informações de tudo que transcorre dentro da Universidade, organizam reuniões familiares em diversas localidades do país (onde uma família, recebe a comunidade Caltech de sua região, em sua própria casa) e zelam por pequenos cuidados aos alunos como se estivessem cuidando de seus filhos (um exemplo disso é o "kit de sobrevivência às finals": um pacote enviado a cada aluno, com um monte de tranqueirinhas, tipo salgadinho, chocolate, guloseimas e até ioiô, para desestressar os alunos nas provas finais de cada trimestre. Eles pedem que enviemos um dinheiro, em média U$ 20, para financiar essa compra e também nos enviam um papel para escrevermos um bilhetinho de "boa sorte". Ah, mas não cobram dos alunos internacionais!)
      Outro cuidado é que a Universidade contrata um tipo de "diretor". Ele mora em um casarão, praticamente dentro do campus. Sua única função é fazer os alunos felizes. Ele abre sua casa para reunir os alunos, faz refeições ou deixa os alunos usarem sua cozinha para prepararem uma comida.
      Têm departamento de acompanhamento psicológico, departamento para alunos internacionais e outro para as minorias. Existe um grande sistema de tutores, seja no alojamento ou orientadores que auxiliam nas questões acadêmicas.
      Como mantém sempre as informações atualizadas, seja em twitter ou facebook, é muito fácil sabermos sobre resultados de jogos ou atividades extra-curriculares.
      Os pais, portanto, acompanham a vida do seu filho, mas sem precisar vigiar seu boletim. Eu diria, que podemos nos envolver com o universo deles, sem controlá-los.

      Talvez tudo isso favoreça um ambiente que os estimule a estudar, a desenvolver projetos e a alcançar excelência acadêmica. Por outro lado, não descartam totalmente a importância dos pais, nos permitindo participar da vida deles, sem interferir na autonomia dos jovens.

      Só porque um filho entra na faculdade, ele não adquire o direito de, simplesmente, romper com toda a nossa preocupação e cuidado para com a vida deles. Acho que tudo isso é um processo. Os que são verdadeiramente "mimados" são aqueles que acreditam que têm direito de levar a faculdade do jeito que querem, bebendo, indo para festas sem hora para voltar, não dando satisfação de nada, mas ainda dependendo de nossa "casa, comida e roupa lavada"!
     

   

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